Em
1997, o inglês Robert Garside iniciou uma corrida cuja meta era completar uma
volta ao mundo. Embora tenha recolhido numerosas evidências de sua jornada, foi
diversas vezes acusado de impostor – críticos alegaram, por exemplo, que
Garside não teria atravessado correndo todo o imenso e inóspito deserto de
Nullarbor, na Austrália. Para Dan Koeppel, entretanto, as evidências são
bastantes para comprovar o feito. No artigo apresentado aqui, ele une comentários
descrevendo a corrida de Robert Garside com um relato de sua própria experiência,
quando – com o objetivo de verificar a plausibilidade do relato do inglês de
sua travessia do deserto australiano – buscou ele próprio cruzar a região.
Neste
resumo, diferentemente do artigo, divido os comentários em dois tópicos, o
primeiro sobre a corrida de Robert Garside e o segundo sobre a experiência de
Dan Koeppel atravessando o deserto de Nullarbor.
A volta
ao mundo de Robert Garside
Desde
criança, Robert George Garside tem o hábito de correr. Quando adolescente,
criou um fascínio pelas viagens, ao ver a mãe voltar ao país natal, a
Eslováquia, depois de separar-se de seu pai para pôr fim a um casamento
difícil. Desde então, “[e]u queria ver o mundo porque esse é um jeito de
entender as coisas”. Anos mais tarde, quando frequentava uma faculdade de
psicologia, ele teve a ideia de verificar no Livro Guiness dos Recordes se
alguém já havia realizado a volta ao mundo correndo. A resposta era negativa, e
Robert Garside determinou para si a meta de estabelecer este recorde.
Ele
divulgou seu plano, conseguiu patrocinadores e se autointitulou “O corredor”.
Mas por duas vezes o plano falhou. Além de deparar-se com mais dificuldades do
que esperava ao longo do percurso, também enfrentava problemas em seu
relacionamento com uma namorada. Na primeira vez, interrompeu a corrida por
volta dos 1600 km. Na segunda, chegou na Eslováquia, onde visitou a mãe, mas acabou
parando por tempo demais, contrariando as regras estipuladas pelo Guiness. Em
1997, todavia, o relacionamento já tinha terminado, ele estava mais disposto do
que nunca a cumprir seu plano, então saiu de Nova Délhi (capital da Índia) em
sua terceira tentativa.
Dan
Koeppel comenta: “O que significa dar a volta ao mundo correndo? Essa tarefa
pouco tem a ver com uma ultramaratona e mesmo com a tentativa de bater um
recorde. Conquistar um feito inédito em uma enorme, porém definida, distância
ou espaço de tempo. Nessa empreitada, velocidade não é importante.” O Guiness
determinou que Robert deveria percorrer uma distância maior do que o Trópico de
Capricórnio (cerca de 37000 km), ficando a quilometragem diária por conta do
participante. Ele iniciou em Nova Délhi em 20 de outubro de 1997, atravessou a
China, foi o Japão, dali pegou um avião para a Austrália, onde fez a travessia
do deserto, depois iniciou a travessia das Américas (desde Punta Arenas, no
Chile, passando pelo Brasil, pela América Central e pelos Estados Unidos),
pegou outro avião para o continente africano, percorreu ali alguns países, daí
partiu para a Europa e finalmente concluiu chegando outra vez a Nova Délhi, em
13 de junho de 2003. Foram cinco anos e oito meses de viagem, totalizando cerca de 64370 km. Neste percurso,
Robert enfrentou problemas de dinheiro e muitas vezes ficou sem saber que
caminho seguir.
Porém,
outra jornada começou em seguida, desta vez para defender a veracidade de sua realização
em face de numerosos céticos. O pior foi que o Guiness – mesmo admitindo que as
evidências reunidas por Garside ao longo da corrida eram convincentes – hesitou
em reconhecer o seu recorde, alegando que era muito difícil ter uma certeza absoluta de que havia realmente sido conquistado.
Dan
Koeppel e o deserto de Nullarbor
O autor
do artigo, além de fazer uma revisão cuidadosa das provas da corrida de
Garside, decidiu enfrentar por si mesmo o trecho a respeito do qual os relatos
do inglês eram mais questionados: o deserto de Nullarbor. Ele se lançou na única
estrada que cruza o deserto, entre as cidades de Perth e Adelaide – uma faixa
de 2676 km de extensão. Duas vezes maior do que o estado da Flórida, o nome do
deserto significa “sem árvores”, e tão pouca gente vive naquela região que inexiste
registro oficial do número de habitantes. Há diversas “estações de serviço”, a
distância entre 70 e 200 km – longe de ser o bastante para tornar uma corrida por
aquela estrada menos do que um imenso desafio.
Dan
Koeppel afirma: “De todos os lugares onde Garside correu, aqueles que não
acreditavam nele defendiam que Nullarbor – o impossível, tórrido Nullarbor –
era onde ele havia inventado as maiores mentiras para validar sua conquista”. E
mais adiante: “Do ponto de vista de quem está sentado em uma poltrona, olhando
mapas que só mostram a aridez de um local onde não há rios, lagos nem poças de
água, parece absolutamente impossível correr em Nullarbor. Mas, quando você
está lá, há uma maneira. Robert Garside descobriu esse segredo. E eu também.” Em
síntese, o segredo, que o inglês já havia contado a Koeppel num e-mail enviado
anos antes, é recorrer aos motoristas que eventualmente cruzam a estrada para
conseguir água e outros mantimentos. “O segredo para correr em Nullarbor acabou
sendo a hospitalidade australiana”, disse Garside.
Mas
isso não impediu que Dan Koeppel enfrentasse dificuldades imensas. Assim ele
descreve um trecho crítico da travessia: “Meu corpo estava sofrendo. Eu tinha
bolhas nos pés. Meu dedinho direito estava cortado, infeccionado, e minha meia,
inundada de sangue. Meu pé esquerdo também estava inchado e com bolhas, e eu
tinha a sensação de que ele estava tentando explodir para fora do tênis.” E
completa com este balanço dos resultados: “Mais de um ano depois, meus pés continuam machucados. As bolhas
reaparecem sempre que corro mais de 8 km. Minha mecânica de corrida mudou,
provavelmente por causa de Nullarbor.”
E
quanto à volta ao mundo de Robert Garside? Dan Koeppel encerra seu artigo
afirmando: “[E]u, assim como qualquer um que tenha realmente visto as
evidências, concluí que a corrida de Robert era legítima”.
Referência:
KOEPPEL,
Dan. “Volta ao mundo em uma corrida”. Runner´s world. Ano 5, nº 52. Fev.
2013.